De como matar uma vocação

Se você é um jovem católico daqueles que se envolvem muito com as coisas da Igreja, eu seria capaz de apostar que, em algum momento, já te fizeram essa pergunta: 

"E aí, vai ser freira?" ou "Quando vai virar padre?" 

Isso acontece com uma grande frequência e, dependendo de como você leva a situação, é normal. Se você é um jovem católico bem ativo, muito provavelmente já se perguntou sobre a sua vocação, chegou a uma conclusão ou ainda está em discernimento. Nada mais natural. 

O processo de discernimento vocacional é um período importante na vida de um cristão e é absolutamente necessário. Afinal, a vocação é um chamado único de Deus, um chamado pessoal que precisa ser atendido e respondido com amor. Ele nos chama, primeiro, à santidade e, para que sejamos santos, nos confere uma vocação específica. 

Até aí, tudo bem. Mas precisamos lembrar de uma coisa muito importante: é um chamado pessoal. 

Cada pessoa possui a sua trajetória, o seu caminho de fé, a sua vida interior. Cada um é responsável pela sua intimidade com Deus e pelo seu processo vocacional. Além disso, a cada pessoa cabe corresponder à sua vocação. O discernimento é pessoal, a resposta é pessoal, a vocação é pessoal. 

É muito comum que os jovens ouçam de seus amigos, conhecidos e desconhecidos também: "E a vocação?", "Quando vai pro convento?", "Vai ser freira?", "Tem certeza que tua vocação não é outra?", "Ih, do jeito que tu te veste, só pode que vai ser freira!", "Hum, estuda tanto! Aposto que vai ser padre". Meus queridos, só parem. 

Se há tanta preocupação com a vocação daqueles que convivem ao seu redor, reze por eles. Reze para que Deus envie Suas luzes sobre aquela pessoa e a ajude a discernir e corresponder com fidelidade. Seja apoio, seja sustento. Só não seja chato. 

A roupa, o véu, o serviço, o estudo, a busca pela santidade... Nada disso escancara a vocação de ninguém. Vestir com modéstia, respeitar a Liturgia, buscar conhecer a Verdade, lutar pelo Céu... Tudo isso é regra, não exceção. A vocação vai além disso. 

A vocação é o sentido da vida de uma pessoa, é a sua identidade, é o seu ser. Corresponder à vocação é uma decisão que só aquele que ouve o chamado de Deus pode tomar. Se você acha que alguém está "discernindo errado" a sua vocação, reze por ela. Mas, não encha a paciência daquele ser. 

Muitas vezes, Deus possui uma vontade e nós possuímos outra. O discernimento vocacional também nem sempre é fácil. Imagine que você tenha sonhado a vida inteira em ser pai, mas o Senhor te chama a ser sacerdote. Imagine que você tenha desejado com todas as forças ser religiosa, mas Cristo quer que você seja mãe de família. Esses conflitos já são profundos o suficiente. Agora imagine amigos, familiares, conhecidos e pessoas desconhecidas opinando: "Ah, eu acho isso", "Mas eu penso aquilo", "Ai, você não está insistindo no projeto errado?", "Deus te disse que era o matrimônio? Ah, acho que não, hein?". 

Assim se mata uma vocação. 

Deus, que nos criou, sabe o que é melhor para nós. Seu plano de amor é tão grande, tão belo, tão incrível, que precisa ser descoberto na intimidade, na conversa única e irrepetível entre Deus e o vocacionado. Mas esse diálogo amoroso acontece no silêncio de um coração. Seus pitacos, seus palpites, sua "vontade de ajudar" gera barulho, angústia, irritação e bloqueio. Tudo isso impede a abertura do coração à vontade amorosa do Pai. Se não nos abrimos, Ele não opera.

Além do mais, a sua vocação está tão bem discernida a ponto de poder palpitar na vocação dos outros? Você já se perguntou se "está discernindo certo", ou está apenas seguindo o fluxo da sua vontade? Será que tanto interesse na vocação do outro não demonstra uma vocação enrustida no seu coração? Uma resposta que Deus pede, mas você quer que os outros deem no seu lugar? Muitas vezes, aquilo que projetamos nos outros é reflexo do que habita em nós. 

Que Deus nos ajude a discernir bem e corresponder com fidelidade, sendo apoio e não empecilho.

Grande abraço, 

Aline.